Wednesday, February 23, 2011

Album Review #2

Album: Forth
Artista: The Verve
Ano:
2008

Selo:
Parlophone

Nota:
9,40

Pontuação:
94


Oito anos depois de separados, os ingleses de Wigan resolveram se reunir mais uma vez em sua formação original para lançarem seu quarto álbum. Ouso dizer que Forth é tão bom quanto o Urban Hymns. Muitos discordam, como a AllMusic e o Pitchfork, mas essa é a minha opinião.


Em Urban Hymns, The Verve foi capaz de traduzir sua psicodelia para uma linguagem mais acessível, mais pop, sem perder o ímpeto e o vigor de A Northern Soul, nem a construção dos sons paisagísticos e as texturas oníricas de A Storm In Heaven. Em Forth, o ouvinte pode encontrar tudo isso, e num estágio ainda mais avançado, eu diria. Em todo seu curso, o álbum se mostra mais experimental que o antecessor, mas sem perder a consistência.

Para alguns, Forth é apenas mais do mesmo; para mim, é a reafirmação daquilo que é The Verve, síntese de toda sua carreira - ainda que descontínua - e a capacidade de fazer música de um jeito que poucos fazem.

The Verve muitas vezes foi comparado com o Oasis pelas semelhanças sonoras, pela origem e pelas mesmas influências que tiveram - os Stone Roses sendo a mais evidente delas. Mas existe uma diferença crucial entre a forma Verve e a forma Oasis de se fazer rock.

Owen Morris, que já produziu ambos, fez uma comparação interessante entre Noel Gallagher e Nick McCabe, guitarristas das duas bandas: “ele (McCabe) jamais tocará a mesma coisa novamente. Já o Noel, você pode pedir para ele tocar a mesma linha de guitarra cem vezes; desde que haja um bom motivo para fazê-lo, ele o fará. Com o Nick, sem chance. Mas é o que ele faz, não é?”

Para Morris, acredito que tenha sido muito mais fácil ter trabalhado com o Noel. Disse outrora que Nick era um “pesadelo”. Mas existem os prós e contras. Noel não tem, de longe, a desenvoltura e o virtuosismo de McCabe. Imagino que seja fácil para este fazer o que Noel faz na guitarra, ainda que a contragosto, já que o seu barato é improvisar. Mas e Noel? Consegue criar as linhas hipnóticas de McCabe? Acho que não. Não estou desmerecendo o Noel. Só quis deixar clara uma das diferenças cruciais entre The Verve e Oasis.

Agora, às canções:


Nota Individual das Canções:


09 – Sit and Wonder

09 – Love is Noise

10 – Rather Be

10 – Judas

09 – Numbness

10 – I See Houses

09 – Noise Epic

09 – Valium Skies

09 – Columbo

10 – Appalachian Springs


Sit and Wonder
confere ao álbum uma introdução agressiva, enérgica, como A New Decade, mas com toda a ambientação e densidade de Star Sail; ela dá uma boa noção do que será o resto da obra. Nela se resume muito de seu conteúdo integral: os delírios e trocadilhos de Ashcroft, o malabarismo envolvente de McCabe na guitarra e o dinamismo de Salisbury na bateria e Jones no baixo.


As letras podem não fazer muito sentido aqui, e nem precisam: “...and she’s the teacher, and I’m the pupil, but I ain’t learning anything at all”. A situação seria exatamente essa: apenas sente e imagine; a música é a sua tutora, mas você não vai aprender nada, e nem precisa. Tudo o que você precisa aprender, aliás, é a sentir a música.



O primeiro single do álbum, Love is Noise, tem um título e refrão interessantes: “Love is noise, love is pain, love is this blues that I’m singing again”. Inteligente, não há nada de absurdo nisso. Não é fácil encaixar uma frase tão coerente como essa em um refrão sem soar clichê, por mais que pareça (soou clichê? Pra mim não).


Só um puxão de orelha: esta música seria perfeita ao meu ver, não fosse aquele coral irritante do Ashcroft no fundo, que canta durante a música inteira. Para alguns, esse foi o charme da música, mas a mim não agradou. Por isso a nota 09.


McCabe, Ashcroft, Salisbury e Jones

Rather Be
é outro poema. Basta ler nas entrelinhas: está tudo claro e objetivo. O refrão é sensato e ao mesmo tempo intenso: “but I’d rather be here than be anywhere. Is there anywhere better than here? You know these feelings I found, they are all so rare. Is there anywhere better than here?” Excelente.


Quanto ao instrumental, bom... Preciso falar do instrumental? Acho que posso dispensar comentários ao seu respeito. McCabe é um gênio, de verdade, pelo menos naquilo que sabe fazer muito bem: tocar guitarra com delays e loops. O riff do piano e os vocais de apoio também estão muito bem colocados.



Eis a menina dos olhos: Judas. Com uma abordagem "a la A Storm In Heaven", esta é uma forte candidata a melhor música do Verve, “ever”. O trabalho de McCabe aqui é de dar inveja; é um exemplo mestre de como se pode usar o delay. Nem eu sabia que este efeito podia desenhar “paisagens sonoras” tão paradisíacas. A guitarra é um instrumento poderoso, e aqui você percebe fácil.

“Feelings, only feelings, just worthless, so I let them go...” Ashcroft parece que adivinhou o que dizer na música em seus primeiros versos. É tudo o que se espera ouvir em uma canção etérea e viajante como essa.



Numbness. Pois é, numbness. Se você ouvir a música, vai entender. Só em seus primeiros acordes já se pode notar sua proposta. É poderosa, como aqueles antigos e bons blues que sempre guardam “aquele” solo de guitarra. Aqui se tem uma boa influência de blues, a propósito. Citei o gênero propositalmente, porque Numbness é um blues que não exige virtuosismo. McCabe, como The Edge, é econômico nas notas. Mas a cada nota que toca, parece tocar em um ponto vital da alma. São sequências precisamente sensatas e comoventes. Desculpe, não tinha como não elogiar.


A próxima canção, I See Houses, mostra um cenário sombrio e assustador. “I see houses, rows and rows of red bricks; I see black cars, some blood-stained exit.” Ela induz àqueles momentos de reflexão em que pensamos: será que um dia vai mudar? Ou, como reza o refrão: quantas vidas vou desperdiçar? Quantas lágrimas terei que derramar pela minha liberdade?

E não é difícil de lembrar que, mesmo tendo nós as dificuldades, as lutas do dia-a-dia, existem pessoas cujas vozes não são ouvidas, cujos direitos não são atendidos, pessoas que vivem em meio à violência, sob um regime de repressão e medo. Essa ideia, que me ocorreu, fica mais evidente no final, quando Ashcroft canta: “murder, trouble and strife, turning me into another guy.” São coisas que, quando acontecem diante de nossos olhos, nos transformam e nos comovem pelo impacto que causam.



Noise Epic, que remete aos delírios de A Northern Soul, é um rock progressivo interessante, e é claro, psicodélico como quase tudo neste álbum. O riff de início orienta uma boa parte da música, que é dividida em três fases: na primeira, existe aquela estrutura padrão de verso e refrão – nos versos, Ashcroft não canta; antes, ele os recita, quase como se os falasse, mas com uma certa sincronia na música.


A segunda fase seria uma evolução da primeira, onde se cria gradualmente um clima de tensão e clímax. Já a última fase se caracteriza por uma mudança brusca no ritmo e na abordagem, tornando-se uma melodia agressiva, desesperadora, que culmina em algo como o despertar de um sonho, um pesadelo ou uma alucinação. É uma ideia que fica clara quando Ashcroft repete, como se fosse um alarme-relógio: “wake up, wake up, wake up.” A letra da música, onde há um cuidado maior com os vocábulos e as rimas, tem uma dinâmica inteligente, digna de nota.



Valium Skies
é marcante pelo riff, que é a assinatura da canção, e também pelo refrão. Seu arranjo remete a Lucky Man - ela encaixaria perfeitamente em Urban Hymns. É agradável, simples e pop, talvez a mais pop do álbum (pra mim até mais pop que Love is Noise e Rather Be).



Columbo
volta ao experimentalismo de Numbness; é extensa, progressiva, experimental, mas com um arranjo diferente desta. Pode não estar entre as melhores do álbum, mas sem dúvida mantém o alto nível e coerência de seu coteúdo.



Enfim, Appalachian Springs, a faixa derradeira, que não poderia ser melhor. Encerramento perfeito, mostra com maestria como uma música pode evocar sentimentos profundos, que não podem ser facilmente explicados por palavras.

Não são muitas as canções que me dão arrepios. Esta é uma delas - ela e Judas, as minhas preferidas. Encena um drama que se traduz em seus primeiros versos: “does anybody know where we’re really going to go?” Um clima de dúvida, incerteza e, depois, como o resto da letra expõe, autodecepção: “took a step to the left, took a step to the right; I saw myself and it wasn’t quite right.”


Agora, com toda sinceridade, não entendo (nem faço a questão de entender) como a AllMusic conseguiu dar irrisórias 3 estrelas para este álbum. Pra mim é inconcebível. Já o Pitchfork dar nota 5.0 de 10.0 - bom, o Pitchfork a gente já sabe, é bem arbitrário. Como já disse antes, não sei o que se passa pela cabeça desses críticos!


Veja também:

Album Review #1 - Achtung Baby (U2)
Album Review #3 - Get There (Boa)
Album Review #4 - High Violet (The National)
Album Review #5 - Bloodflowers (The Cure)
Album Review #6 - The Bends (Radiohead)

2 comments:

  1. irretocável resenha.
    pra fins de complemento, ressalto o bom nível de b-sides deste grande álbum, músicas como All Night Long e Muhamed Ali.

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  2. Errata:

    The Verve é de Wigan, e não de Manchester, como publiquei de início. Erro consertado.

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